A ação do espírito sobre o físico é de tal modo evidente, que se vêem, freqüentemente, graves desordens orgânicas se produzirem pelo efeito de violentas comoções morais. A expressão vulgar “A emoção lhe altera o sangue” não está tão privada de sentido como se poderia crer; ora, o que pôde alterar o sangue senão as disposições morais do espírito?
Pode-se, pois, admitir que o temperamento é, pelo menos em parte, determinado pela natureza do Espírito, que é causa e não efeito. Dizemos em parte porque há casos em que o físico, evidentemente, influi sobre o moral: é quando um estado mórbido ou anormal é determinado por uma causa externa, acidental, independente do Espírito, como a temperatura, o clima, os vícios hereditários de constituição, um mal-estar passageiro etc. O moral do Espírito pode, então, ser afetado, em suas manifestações, pelo estado patológico, sem que a sua natureza intrínseca seja modificada.
Escusar-se, de suas faltas, em razão da fraqueza da carne, não é, pois, senão um subterfúgio para escapar da responsabilidade. A carne não é fraca senão porque o Espírito é fraco, o que reverte a questão e deixa, ao Espírito, a responsabilidade de todos os seus atos. A carne, que não tem nem pensamento e nem vontade, não prevalece jamais sobre o Espírito, que é o ser pensante e que decide; é o Espírito que dá, à carne, as qualidades correspondentes aos seus instintos, igual um artista imprime, em sua obra material, a marca do seu gênio.
A responsabilidade moral dos atos da vida, pois, permanece inteira; mas, a razão diz que as conseqüências dessa responsabilidade devem estar em relação com o desenvolvimento intelectual do Espírito; quanto mais este seja esclarecido, menos é escusável, porque, com a inteligência e o senso moral, nascem as noções do bem e do mal, do justo e do injusto.
Essa lei explica o insucesso da Medicina em certos casos. Desde que o temperamento é um efeito, e não uma causa, os esforços, na tentativa de modificá-lo, necessariamente, são paralisados pelas disposições morais do Espírito, que opõe uma resistência inconsciente e neutraliza a ação terapêutica. É, pois, sobre a primeira causa que é preciso agir. Dai, se for possível, coragem ao covarde, e vereis cessarem os efeitos psicológicos do medo.
Isso prova, uma vez mais, a necessidade, para a arte de curar, de se levar em conta a ação do elemento espiritual sobre o organismo.
Fonte: Revista Espírita, março 1869, p.65